Cada vez mais se discute a relação entre as favelas e a crise climática. Essas áreas urbanas densamente povoadas e muitas vezes carentes de infraestrutura básica estão na linha de frente das mudanças climáticas. Aproximadamente 60% das favelas no Brasil não possuem quaisquer obras de prevenção de riscos, o que as torna extremamente vulneráveis aos impactos dos eventos climáticos extremos.
Vulnerabilidades Específicas nas Favelas
As favelas brasileiras enfrentam uma série de vulnerabilidades que são exacerbadas pelas mudanças climáticas. Estudos indicam que 86% dessas comunidades sofrem com um ou mais eventos climáticos extremos por ano. As ondas de calor intensificam-se em 71% das favelas, afetando a saúde pública e trazendo riscos repentinos. As tempestades e vendavais atingem 56% dessas áreas, elevando o risco de deslizamentos de terra e danificação das habitações precárias.
Além disso, as enchentes são uma realidade contínua para 54% das favelas, agravadas pela falta de sistemas de drenagem adequados (ausentes em 70%). Este ambiente insalubre intensifica a exposição a doenças relacionadas à água, criando um círculo vicioso de pobreza e vulnerabilidade. No inverno, as ondas de frio combinadas com a falta de abastecimento de água impactam 50% das comunidades, tornando urgente o desenvolvimento de sistemas de proteção e infraestrutura resiliente.
Ausência de Infraestrutura de Proteção
Mais crítico ainda é a falta de infraestrutura de proteção em grande parte das favelas. Cerca de 70% dessas regiões não possuem abrigos de emergência para seus moradores, enquanto 60% carecem de estruturas de contenção contra enchentes e deslizamentos. Isso não só ressalta a omissão estatal, mas também a profunda violação dos direitos humanos básicos dessas populações. Em um levantamento abrangendo 119 comunidades entre 51 municípios, constatou-se a hiperprecariedade dessas áreas, onde a negligência na implementação de políticas públicas de prevenção é clara.
Desigualdades Socioambientais e Raciais
A desigualdade na distribuição dos riscos climáticos é evidente quando se observa a composição demográfica das favelas. Comunidades onde a maioria da população é composta por indivíduos racializados enfrentam maiores riscos. A sobreposição de fatores como alta densidade populacional, condições de habitação inadequadas e baixas capacidades de adaptação e mitigação aumentam a vulnerabilidade. Este é um problema não apenas climático, mas também racial e social, exigindo uma abordagem interseccional na formulação de políticas climáticas eficazes.
Políticas Públicas e Programas de Formação
Para combater as adversidades, algumas iniciativas têm sido realizadas através de programas governamentais e não-governamentais. O Programa Periferia Sem Risco é um exemplo central desses esforços, oferecendo formação em redução de desastres e elaboração de Planos Comunitários de Redução de Riscos (PCRA). Ele busca integrar conhecimento técnico ao saber local, capacitando os moradores a lidarem melhor com os riscos climáticos.
As oficinas sociotécnicas e módulos de planejamento urbano inclusivo promovidos pelo programa têm como objetivo propor soluções adaptativas que respeitem a especificidade socioterritorial das favelas, alinhando-se com as necessidades reais dos seus habitantes.
Estratégias de Mapeamento e Monitoramento
Uma das formas mais eficazes de se mitigar os riscos climáticos é através do mapeamento de riscos. Este mapeamento permite a identificação das áreas mais vulneráveis dentro das comunidades, facilitando intervenções direcionadas e utilização eficiente de recursos. Ferramentas como aplicativos que permitem aos moradores reportarem alagamentos e riscos em tempo real têm se mostrado estratégicas para a gestão comunitária de riscos. Esses dados não apenas auxiliam prefeituras e órgãos competentes a agirem de forma proativa, mas também proporcionam à comunidade um recurso valioso na luta contra os efeitos das mudanças climáticas.
Impactos na Saúde e Doenças Relacionadas
A saúde pública nas favelas está dramaticamente vinculada à falta de infraestrutura adequada. Após eventos de chuva intensa e enchentes, há um aumento significativo na incidência de doenças como a leptospirose, que resulta do contato com água contaminada, e doenças gastrointestinais relacionadas à falta de saneamento. Isso não apenas sobrecarrega o sistema de saúde local, mas também perpetua um ciclo de doenças evitáveis. A integração de esforços entre a comunidade, organizações de saúde e o Sistema Único de Saúde (SUS) pode ser crucial para implementar um sistema de vigilância climática efetivo.
Soluções Tecnológicas e Comunitárias Inovadoras
Soluções inovadoras e tecnológicas têm um papel essencial na construção de resiliência urbana nas favelas. O uso de drones para mapeamento aéreo das áreas em risco e inteligência artificial para previsões meteorológicas locais são avanços significativos que podem ser adaptados às realidades das favelas. A implementação de hortas urbanas não só fomenta a segurança alimentar como também fortalece a comunidade contra efeitos de mudanças climáticas, mostrando-se uma solução auto-sustentável. Inspirados por modelos globais, esses métodos, quando localmente adaptados, podem capacitar lideranças locais e promover um desenvolvimento mais justo e participativo.
Perspectivas Futuras e Financiamento
Para efetivar quaisquer mudanças, é preciso considerar as perspectivas futuras de financiamento dos projetos climáticos. A atualização do Plano Nacional de Adaptação é um primeiro passo crucial, necessitando de um claro direcionamento de recursos. As fontes de financiamento, que incluem fundos climáticos internacionais e parcerias público-privadas, poderiam ser responsáveis por viabilizar as operações necessárias para criar infraestrutura resiliente nas favelas. Criar uma estrutura financeira eficiente e forte pode ser a chave para garantir a proteção dos milhões de brasileiros que vivem nessas comunidades contra os devastadores impactos da crise climática.
*Texto produzido e distribuído pela Link Nacional para os assinantes da solução Conteúdo para Blog.
